Ex-diarista vira vice-campeã brasileira de xadrez e participa de mundial

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Cibele Florêncio, 24 anos, nascida e criada na cidade de Macaíba, no interior do Rio Grande do Norte.

Em dezembro de 2021, Cibele Florêncio, 24 anos, precisou correr para tirar um passaporte às pressas e fazer sua primeira viagem. O motivo era urgente: ela garantiu uma vaga para competir no campeonato mundial de xadrez, em Varsóvia, capital da Polônia. Essa foi a grande virada da sua vida até então, um resultado direto das peças que ela começou a movimentar lá atrás, ainda durante a infância.

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Afinal, a paixão pelo xadrez teve início ainda aos 9 anos, quando a jovem de Macaíba, no interior do Rio Grande do Norte, aprendeu as regras do tabuleiro, graças a um projeto realizado pela prefeitura na escola em que estudava. Desde então, o jogo nunca mais saiu de sua vida. “Eu entendia o jogo com mais rapidez que minhas coleguinhas. Quando o professor fazia uma pergunta, eu soprava a resposta para elas. E estava sempre certa”, diz Cibele.

“Aí, o professor me levou para um torneio e fiquei em segundo lugar. Adorei receber uma medalha e, desde então, sempre queria estar jogando”, lembra ela. Foram anos de uma rotina de treinos, como aluna e depois como monitora, contando com o apoio do projeto e do professor, que ajudavam com taxas de inscrição e transporte para torneios.

Faxina de dia, partidas à noite

O projeto, porém, acabou em 2014, e Cibele se viu sem custeio. Filha de mãe-solo e a quarta entre sete irmãos, Cibele teve que lidar com uma realidade financeira desfavorável desde a infância.

Quando começou a trabalhar, teve início a sua dupla jornada: faxina de dia, para se sustentar, e partidas jogadas com a irmã ou on-line, à noite, vencendo o cansaço. Ela conta que já trabalhou como babá, faxineira e garçonete, entre um bico aqui e outro ali. Tudo isso somado à responsabilidade de ela mesma ter se tornado mãe-solo do pequeno Nicolas, hoje com 5 anos de idade. Com o dinheiro que eventualmente sobrava, ela conseguia pagar a inscrição em alguns campeonatos. Ainda assim, no momento mais crítico, ficou cerca de dois anos sem treinar e competir.

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O amor pelo xadrez, porém, sempre a chamava de volta. “Quando eu jogo, me sinto bem, tranquila. Essa sempre foi uma das minhas motivações e, por isso, eu nunca desisti”, diz Cibele. “Depois que fui para o mundial, ganhei ainda mais estímulo, vendo como o xadrez é mais prestigiado lá fora e como ele pode mudar a sua vida.”

Uma vaga no mundial

Assim, a despeito de não treinar tanto quanto gostaria, a recompensa chegou no fim de 2021: Cibele foi vice-campeã brasileira e, com a conquista, garantiu uma vaga no mundial. Começou, então, outra correria: “Desde que avisaram que eu tinha sido classificada, foi muito perrengue até eu colocar o pé dentro do avião. Três dias antes do voo eu não tinha nada”.

Para viajar, ela contou com a ajuda de ex-patrões, que doaram roupas de frio e acionaram uma prima que trabalha numa rádio e chamou a enxadrista para contar sua história ao vivo. Assim que acabou a entrevista, a jogadora tinha um novo patrocinador: os sócios de um hospital local bancaram os custos da sua viagem.

No torneio, Cibele ficou longe do título. Mas, ainda assim, a sensação de participar do mundial já foi uma vitória para ela. “Estive ali, jogando com os melhores do mundo. Quando eu voltei, minha vida virou de cabeça pra baixo: o hospital continuou a me patrocinar, agora tenho um professor e estabeleci como regra treinar pelo menos duas horas todos os dias.”

Oportunidades para outros jovens

Desde fevereiro, ela trabalha no próprio hospital, na área de limpeza, e também ganhou uma bolsa de estudos para cursar educação física. Além disso, administra uma agenda que conta com parcerias, entrevistas e eventos surgindo a todo o momento.

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O objetivo de Cibele agora é treinar bastante para buscar o título nacional e chegar ao mundial novamente. Enquanto isso, ela nutre outros sonhos, como lançar um projeto que possa estimular a prática do xadrez entre os jovens da sua comunidade. “Muitos adolescentes jogam bem, mas não têm assistência nenhuma. O xadrez traz coisas boas para mim e para as pessoas ao meu redor. Por causa do meu amor pelo xadrez, minha vida se transformou.”

 

Texto: Gabriel Oliveira
Foto: Alessa Oliveira

Conteúdo publicado originalmente na TODOS #43, em maio de 2022.

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